Quilombo dos Palmares




Edson Aparecido Pereira de Lima
Reginaldo Marcelo








Qual o motivo da Longevidade do Quilombo dos Palmares?




Trabalho realizado na disciplina “Brasil Colônia”,
sob orientação do Professor “Darcy Fortes” do curso de
História das Faculdades Associadas Ipiranga.



São Paulo, Novembro de 1999.









Esperando um Mundo Novo

“Penso que os sofrimentos do momento presente não se comparam com a glória futura que deverá ser revelada em nós.
A própria criação espera com impaciência a manifestação dos filhos de Deus.
Entregue ao poder do nada - não por sua própria vontade, mas por vontade daquele que a submeteu -, a criação abriga a esperança, pois ela também será liberta da escravidão
da corrupção, para participar da liberdade e da glória dos filhos de Deus.
Sabemos que a criação toda geme e sofre dores de parto até agora.
E não somente ela, mas também nós, que possuímos os primeiros frutos do Espírito, gememos no íntimo, esperando a adoção, a libertação para o nosso corpo. Na esperança,
nós já fomos salvos. Ver o que se espera já não é esperar: Como se pode
esperar o que se vê? Mas, se esperamos o que não vemos, é na perseverança que o
aguardamos. Rm 8.18-25

Bíblia Sagrada
 Oração da Campanha da Fraternidade - 2000 Ecumênica

Ó Deus, que nos criaste à tua imagem,
diante de Ti trazemos
as vítimas deste nosso País,
vítimas de um sistema que exclue
pobres, índios, negros,
mulheres e crianças.

Senhor, eis-nos aqui,
pedindo perdão
por todas essas exclusões
das quais também somos culpados.

Senhor, eis-nos aqui,
pedindo a tua graça
para resgatarmos
a dignidade humana ferida
e construirmos um novo milênio
de fraternidade e de paz.

Por Jesus Cristo,
Nosso Senhor ressuscitado
que por seu Calvário
venceu todos os calvários.
Amém!











 SUMÁRIO

 INTRODUÇÃO
CAPITULO I

1.1. Formação do Quilombo dos Palmares
1.2. Início e desenvolvimento do Quilombo dos Palmares
1.3. Aspectos geográficos da Serra da Barriga
1.4. Os Quilombos não eram um conglomerado de negros bárbaros


CAPITULO II

2.1. Religião e Língua
2.2. Família Poliândrica
2.3. Economia Palmarina
2.4. Situação Política
2.5. Zumbi, O Rei Guerreiro
2.5.1. Zumbi criado na cultura branca e católica romana
2.6. Em Cacaú



CAPITULO III

3.1. Geografia Privilegiada
3.2. Guerrilhas na Serra
3.3. Táticas de Defesa
3.3.1. Construção de fortificações
3.4. Resistência dos Palmarinos
3.5. A Expedição de Domingos Jorge Velho
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA



INTRODUÇÃO
            O nascimento deste trabalho está relacionado com as inquietações de um branco e um negro que se preocupam com a condição daqueles que são excluídos e discriminados pela sociedade atual. Negros, indígenas, deficientes físicos e mentais, prostitutas, são alguns deles, se prestarmos atenção perceberemos que são todos aqueles que não se encaixam no modelo “ideal”, imposto pela sociedade moderna.
           A inquietação surge porque seremos e somos educadores e queríamos aprender como uma sociedade como a de Palmares, formada por negros, indígenas e brancos pobres, sobreviveu por quase um século e mostra aos excluídos que é possível lutar buscando sua cidadania e ser pessoas que não ficam somente à margem da história, mas também serem autores da mesma.
           Durante a confecção deste trabalho, percebemos que um dos “segredos” de Palmares, para sua resistência e longevidade é que todos, sem exceção, eram considerados iguais, não havia pobres ou ricos, tudo era dividido igualmente entre todos.
            Notamos também que entre eles não havia preconceito de cor ou raça. Parece-nos que nas sociedades onde não existe divisão entre ricos e pobres, também não há explorador nem explorado, também não existe preconceito de cor ou raça. Onde existe o preconceito, existe também algum tipo de desigualdade social. O que os unia era o fato de serem pobres, oprimidos e explorados, com isso criaram uma sociedade sem preconceito.
            Os palmarinos resistiram como um povo forte, unidos no ideal de liberdade e igualdade. Unidos nestes ideais lutavam com unhas e dentes, para manterem-se na condição de libertos e manterem a sociedade criada por eles, em moldes africanos.
            Para alcançarmos o nosso objetivo dividimos nosso trabalho da seguinte maneira:
            No primeiro capítulo, trabalharemos o início e o desenvolvimento do Quilombo dos Palmares, assim como os aspectos geográficos da região conhecida como Palmares. Parece-nos que a geografia íngreme foi uma das barreiras para as várias expedições enviadas para destruir Palmares.
Segundo capítulo, discorreremos sobre a organização social, religiosa, econômica e política de Palmares. Nesse capítulo também encontra-se a trajetória dos dois grandes reis de Palmares: Ganga-Zumba e Zumbi.
 Terceiro capítulo, tentaremos demonstrar os vários motivos que levaram o Quilombo dos Palmares a sobreviver por quase um século. Acreditamos que vários fatores foram responsáveis pela sua longevidade. Este conjunto de fatores foram a geografia privilegiada, o sistema de guerrilhas, as táticas de defesa e a própria resistência dos palmarinos.
    Que este trabalho tenha alcançado o objetivo de demonstrar a longevidade do Quilombo dos Palmares, dando uma pequena visão sobre a resistência de um povo oprimido e explorado. Assim como aguçar a curiosidade para o estudo da sociedade Palmarina.


CAPÍTULO I
            A escravidão brasileira sempre foi caracterizada pela desumanidade, opressão, tortura e maus tratos. Os escravos sofriam castigos físicos de diversas maneiras: chicotadas, palmatórias, entre outros. Considerados mercadoria eram vendidos ou trocados, sendo que famílias eram separadas sem nenhuma misericórdia. As escravas eram estupradas pelos seus senhores ou capatazes, gerando uma infinidade de crianças mestiças que acabavam sofrendo com a crise de identidade, pois não se sentiam nem brancas, nem negras.
            No início da colonização do Brasil, utilizou-se da mão de obra indígena, mas diante de sua fragilidade para o trabalho na lavoura, os colonizadores, começaram a importar escravos do continente africano, eram negros capturados e trazidos para o Brasil em navios negreiros. Nestes navios eram empilhados como animais, a maioria morria devido à falta de higiene e má alimentação.
            Trazidos para o Brasil, eram utilizados como mão-de-obra nas plantações de cana-de-açúcar, onde trabalhavam até a exaustão, sendo que a expectativa de vida, devido aos maus tratos era de trinta anos.
            Tirados à força de sua terra, sofrendo todo tipo de maus tratos, os escravos negros se revoltavam e fugiam, formando comunidades chamadas “quilombos”. Segundo resposta do Rei de Portugal à consulta do Conselho Ultramarino datada de dois de dezembro de 1740, quilombo “era toda habitação de negros fugidos que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados nem se achem pilões neles” (6, 16) esta definição, o Brasil se converteu praticamente em um conjunto de quilombos, alguns maiores outros menores. Os quilombos pontilharam todo solo brasileiro: Atibaia-SP, Jabaquara, na capital paulista e o mais famoso de todos, o “Quilombo dos Palmares”, na Capitania de Pernambuco.
Clóvis Moura, os quilombos eram estruturados de acordo com seu tamanho e número de habitantes. Os pequenos possuíam uma estrutura simples, eram grupos armados, que se defendiam como podiam das investidas dos escravistas querendo reaver sua “mercadoria”. As lideranças iam surgindo conforme a necessidade no ato da fuga ou da organização. Os grandes, como Palmares que chegou a ter uma população estimada em vinte mil habitantes, necessitava de uma organização mais complexa.

1.1. FORMAÇÃO DO QUILOMBO DOS PALMARES
            O mais famoso dos quilombos, foi o “Quilombo dos Palmares”, situado na Serra da Barriga, Capitania de Pernambuco, sua origem é anterior a 1600 (talvez 1597), mas a data não é exata. Sabe-se que um grupo de escravos de um engenho em Pernambuco, armados de armas rústicas (pedras, paus e foices) se rebelaram e tomaram o engenho.
            Os escravos rebelados viram-se senhores do lugar que os maltratava e os oprimia, mas viram-se diante de um dilema: se ficassem no engenho, seriam esmagados e rendidos por tropas bem armadas, contra a qual não conseguiriam resistir, por outro lado, se a aldeia fosse erguida no litoral, ficariam livres por algum tempo, mas cedo ou tarde, seriam dominados e devolvidos aos seus senhores, pelos capitães do mato[1].
            Diante destes problemas, decidiram ir para uma região desconhecida, perigosa e temida pelos brancos; a região conhecida como Palmares. Ela recebera esse nome por causa da abundância de palmeirais. A mata era fechada, sem luz, cheia de mosquitos e animais perigosos.
            Tomada à decisão de irem para Palmares, homens, mulheres e crianças, caminharam por muito tempo pela floresta, até escolherem um lugar para fundar a aldeia. O lugar escolhido na Serra da Barriga, foi o início da República dos Palmares.
            Os escravos não tinham escolha, pois apesar de inóspito, Palmares era a única alternativa de se manterem livres.Décio Freitas afirma que: 
Definitivamente, os rebeldes não tinham escolha. A floresta se impunha como única alternativa a reescravização. “Puseram-se então em marcha, levando apenas a roupa do corpo, armas cortantes, instrumentos de trabalhos - e a esquálida esperança” (4,09).
            Os negros rebelados caminharam vários dias antes de adentrarem na selva desconhecida e quase impenetrável, na medida que caminhavam, iam abrindo trilhas na floresta, cujas árvores mal deixavam filtrar a luz. Foram transpondo e descendo pequenas serras até que em determinado ponto avistaram um grande sistema de serras contíguas, muito altas e alcantiladas. Uma dessas serras chamou a atenção do grupo, era um monte muito alto e íngreme em forma de barriga, quando conseguiram chegar ao seu topo, notaram que ela permitia avistar a região por todos os lados, numa distância de dezenas de quilômetros, o monte por si só já constituía uma natural e inexpugnável fortaleza.
            No topo da Serra da Barriga, abriram clareiras e levantaram cabanas cobertas de palha. Segundo Décio Freitas, no livro Palmares, A Guerra dos Escravos, eles chamaram estas cabanas ou choças de mocambo - da língua africana quimbundo mukambu[2], este termo seria usado pelos portugueses para designar genericamente as povoações construídas nas matas de todo o Brasil pelos escravos rebeldes. 


1.2. INÍCIO E DESENVOLVIMENTO DO QUILOMBO DOS PALMARES
            O início foi árduo e penoso, pois tinham que se estabelecer naquele lugar íngreme e selvagem. No começo, viviam de caça, pesca e coleta de frutos. Para os africanos isso era voltar para trás, pois tinham sido povos agricultores, pastores, artesãos, comerciantes e artistas.
            No decorrer do tempo, perceberam que precisavam de mais gente para Palmares, porque necessitavam de mão de obra para desenvolverem o quilombo.
            A população foi crescendo pouco a pouco, a invasão holandesa contribuiu para seu crescimento, primeiro, porque tanto portugueses como holandeses, ocupados com a guerra, não investiram contra Palmares. Em segundo lugar, a confusão criada pela guerra contra os holandeses, permitia que os negros fugissem com mais facilidade e se agregassem a Palmares. A população de Palmares não era constituída somente de negros, ex-escravos, mas também de índios e brancos pobres que encontravam abrigo, alento e verdadeiramente um lar naquele lugar.
            Com o crescimento populacional de Palmares, a produção econômica também cresceu. Havia palmarinos com muito conhecimento de metalurgia, cujas técnicas foram trazidas da África. Nos engenhos tinham sido obrigados a trabalhar com técnicas atrasadíssimas. Agora, em Palmares, podiam produzir o que era necessário ao quilombo, utilizando-se do conhecimento adquirido na África.
            A agricultura também se desenvolveu, agora não dependiam somente da selva, mas cultivavam milho, feijão, mandioca, cana, batata, legumes, assim como vários pomares. Tanto a preparação da terra, como as colheitas, eram comemoradas com festas.
            Das palmeiras, utilizavam o fruto para alimentação, extraíam óleo para iluminação, faziam azeite, manteiga e vinho. Utilizavam-se da casca como cobertura para as casas, e das folhas faziam esteiras, cestas e abanos. Criavam animais domésticos como galinhas e porcos.
            Palmares chegou a ter onze povoações conhecidas, cobrindo uma área de 350 quilômetros, de norte a sul, em terras que hoje pertencem ao estado de Pernambuco e Alagoas.
            Macaco foi a povoação mais importante, situada na serra da Barriga, perto de onde hoje é a cidade de União dos Palmares. Era a capital da República. Tinha por volta de mil e quinhentas moradias, com cerca de oito mil habitantes. As outras povoações eram: Amaro, Suburipa, Osenga, Zumbi, Acotirene, Tabocas, Dombrabanga, Andalaquituche, Alto Magano, Curiva. Estima-se que o Quilombo dos Palmares alcançou uma população de cerca de 20 mil habitantes.


1.3. ASPECTOS GEOGRÁFICOS DA SERRA DA BARRIGA
            O Quilombo dos Palmares estava localizado em uma região muito inóspita e de difícil acesso. O território de Palmares se estendia numa área de 350 quilômetros quadrados, situado entre os rios Ipojuba e Paraíba, na Capitania de Pernambuco, hoje Pernambuco e Alagoas. Havia uma sucessão de serras e, uma muito íngreme em forma de barriga, a Serra da Barriga, que por ser de difícil acesso e permitir uma visão panorâmica da região, foi escolhida para ser povoada em primeiro lugar e onde surgiu a capital de Palmares, Macaco.
            A região continha uma grande quantidade de palmeirais. Havia também árvores gigantescas que impediam a penetração da luz do sol.
            Conforme um documento do século XVII, citado por Décio Freitas, a região de Palmares é descrita como: “um sítio naturalmente áspero, montanhoso e agreste, com tal espessura e confusão de ramos, que em muitas partes é impenetrável a toda a luz; a diversidade de espinhos e árvores rasteiras serve de impedir os passos e intrincar os troncos” (4, 09). Décio Freitas continua dizendo que Palmares era:
Um mundo animal de onças, chacais, serpentes e mosquitos, todos uma ameaça mortal para o homem, ocultava-se naquelas hostis e incógnitas paragens. Como todas as florestas tropicais, era falazmente dadivosa. Sua mesma exuberância como que esmagava e oprimia a vida. O clima versátil oscilava entre frios duros e estiagens destrutivas. Os próprios autóctones haviam sempre evitado a região. (4, 09)
            A região inóspita, foi um dos obstáculos, para as várias expedições armadas contra o Quilombo dos Palmares.


1.4. OS QUILOMBOS NÃO ERAM UM CONGLOMERADO DE NEGROS BÁRBAROS.
            Os quilombos, quando cresciam, favorecidos por uma série de fatores como: isolamento maior, melhor fertilidade do solo, possibilidade de recrutar novos membros para o grupo etc., tinham de se organizar sistematicamente, criando uma estrutura para a comunidade. No início o quilombo, subsistia com o que a floresta oferecia como caça, frutas, raízes, peixes. Desta maneira, surgiam formas de governo, religião, propriedade, família, elementos estes, assunto do próximo capítulo.


CAPÍTULO II
            Palmares continha uma estrutura centralizada que abrangia vários elementos, não era povoado somente de negros fugidos, mas também de índios e brancos pobres.
            No inicio quando o quilombo era pequeno, sobreviviam através de uma vida predatória para sua subsistência e continuidade. Viviam da caça, pesca e coleta de frutas. Mas perceberam que para se desenvolverem necessitavam de mais gente para Palmares.
            A população de Palmares foi aumentando e a produção econômica também. Havia africanos com conhecimentos diversos, como metalurgia do ferro, cujas técnicas foram trazidas do continente africano. Nos engenhos trabalharam com técnicas atrasadíssimas. Agora em Palmares, podiam produzir com seu conhecimento, o que era necessário para ao quilombo. Também houve crescimento na agricultura. Plantavam milho, feijão, mandioca, cana, legumes diversos e mantinham vários pomares, criavam animais domésticos como galinhas e porcos.
            No entanto, à medida que ele crescia procurava organizar-se internamente, com isto, tinha de surgir formas de governo, religião, família e especialmente economia (organização social).


2.1. RELIGIÃO E LÍNGUA
            A religião da República dos Palmares era um cristianismo fortemente sincretizado com elementos religiosos africanos e indígenas.
            O sincretismo também estava presente na língua falada em Palmares, pois como havia elementos de várias nações africanas com idiomas diferentes, além de indígenas e brancos, necessitavam de uma língua comum para poderem se comunicar. A língua palmarina era uma mescla de língua portuguesa, com elementos africanos e indígenas. No Filme Quilombo, de Cacá Diegues, há uma cena em que um dos negros começa a conversar em língua africana e outro negro pede para que ele fale na língua dos brancos para que todos entendessem o que era falado.
            A presença da língua portuguesa e da religião cristã no quilombo precisava ser um fator unificador das pessoas que vinham de lugares e culturas diferentes, então a religião e a língua de Palmares tinha que incluir a todos, sem privilegiar uma tribo em prejuízo da outra. A religiosidade palmarina combinava as diferentes crenças africanas e do cristianismo dos brancos. Para isto, os palmarinos tomavam do “cristianismo” aquilo que ele tem de libertário e jogava fora o “cristianismo” que era ensinado pelos padres nas senzalas, instruindo os escravos a serem passivos e submissos ao senhor de engenho.
            As imagens das divindades africanas partilhavam altares com as de Jesus, Nossa Senhora da Conceição e São Brás. Não consta que os sacerdotes palmarinos tivessem importância política e social. Não há indicações de que formassem uma casta poderosa ou sequer influente.
            Palmares colocou a libertação acima da religião. Tudo que poderia dividir foi modificado, como a língua e a religião.


2.2. FAMÍLIA POLIÂNDRICA
            Nem com o desenvolvimento demográfico, a sociedade palmarina superou o problema do pequeno número de mulheres. A miscigenação, sobretudo com mulheres indígenas seqüestradas nas tribos mais próximas, ajudou a amenizar o problema, porém sem resolvê-lo. Com a carência de mulheres, houve conflitos, em torno de sua posse.
            Para preservar a união social institui-se o casamento poliândrico, que eram casamentos onde as mulheres tinham vários maridos.
            Um documento de 1677, do Conselho ultramarino afirmava que:

cada negro que chega ao mocambo fugido de seus senhores logo é ouvido por conselho de justiça que têm para saber de suas tenções porque são grandemente desconfiados, nem se fiam só do fato de ser negro que se apresente; que tanto se certificam das boas tenções do negro que chega lhe dão mulher a qual possuem junto com outros negros, dois, três, quatro e cinco negros, pois sendo poucas as mulheres adotam esse estilo para evitar contendas; que todos os maridos da mesma mulher habitam com ela o mesmo mocambo, todos em paz e harmonia, em arremedo de família, mas próprio de bárbaros sem as luzes do entendimento e a vergonha que a religião impõe; que todos esses maridos se reconhecem obedientes à mulher que tudo ordena na vida como no trabalho; que a cada uma dessas chamadas famílias os maiorais, em conselho, dão uma data de terra para que a cultivem e isso o fazem a mulher e seus maridos … que à guerra acodem todos nos momentos de maior precisão, sem exceção das mulheres que nessas ocasiões mais parecem feras que pessoas do seu sexo. (4, 38)


2.3. ECONOMIA PALMARINA
            A base da economia palmarina era a agricultura de policultura, plantavam principalmente o milho, que era colhido duas vezes por ano. Depois da colheita descansavam duas semanas. Plantavam ainda feijão, mandioca, batata-doce, banana e cana-de-açúcar. Isto constituía a lavoura que alimentava os habitantes da república, sendo o excedente trocado com os vizinhos. A maior parte da produção era para o consumo coletivo dos habitantes sendo dividido igualmente entre todos.
            Com o crescimento da economia, foram se fazendo várias benfeitorias no Quilombo, como arruamento, duas fileiras de casas, cisternas, a casa grande do conselho, as portas do mocambo, paliçadas e fortificações.
            Com o crescimento econômico de fato, Palmares se constituía em asilo aberto a todos os perseguidos e deserdados da sociedade colonial. Mais tarde até soldados das expedições e mesmo os que eram pagos, em sua totalidade portugueses, não resistiam por vezes à tentação da vida livre e da fartura dos Palmares.

            Décio Freitas afirma:

É que nas comunidades negras reinava uma fartura que oferecia um vivo contraste com a perene miséria alimentar da população do litoral. A abundância de mão-de-obra, o trabalho cooperativo e a solidariedade social, haviam aumentado extraordinariamente a produção. O superproduto social se tornara abundante. Depois de alimentada a população, atendidos os gastos coletivos e guardados em celeiros as quantidades destinadas às épocas de más colheitas, guerras e fertilidade, ainda sobrava algo para trocar por produtos essenciais das povoações luso brasileiras. O caráter nitidamente antieconômico do sistema escravista é ilustrado por este contraste entre o rendimento do trabalho negro quando livre e quando escravo. Era por ser escravo não por ser negro que ele produzia pouco e mal nas plantações e nos engenhos. (4, 65)
            Vivendo num regime comunitário, organizado à base da agricultura e da criação de animais de subsistência, Palmares era um reduto em franco florescimento, apesar da ameaça permanente que sobre ele pairava.


2.4. SITUAÇÃO POLÍTICA
            No começo cada povoação palmarina tinha autonomia, isto pelo fato da distância de uma comunidade para outra, sentiu-se a necessidade da criação de um estado com um governo central. Assim o fizeram e todas se ligaram por um governo central, havendo um chefe (rei) eleito.
            Esse chefe tinha poucos poderes absolutos. O estado central surgiu para juntar forças contra um inimigo comum, e pela necessidade de acomodar grupos de diferentes tribos. Por isso, não é possível comparar Palmares a um determinado reino africano. Havia muita coisa da África, mas era uma sociedade nova, original, marcada pela luta contra a escravidão. Era uma república igualitária, fraternal e livre, mas que precisava de uma autoridade para a defesa militar popular.
            Este chefe passou à história apenas como Ganga-Zumba, título adotado desde que assumiu o poder do estado palmarino, consta que era da nação “arda”, oriundo, pois de Arda (ou Ardra, ou ainda Allada), um dos numerosos estados fundados na costa dos escravos pelos Ewés, raça de fundo paleogrífico e tendência à dolicocefalia[3]. Nação que possuía civilização superior, organização militar severa, notável talento artístico, físico forte e muitas vezes rebelde, sabiam se defender e atacar quando fosse preciso, falavam uma língua inteligível para os demais escravos.
            As funções de Ganga-Zumba correspondiam às de um chefe de estado, existia entre eles um documento português referindo-se a Ganga-Zumba que dizia ser ele, um ministro da justiça, assim como de guerra para execuções necessárias.
            Ganga-Zumba não tomava decisões sozinho sendo que até as para a escolhas de seu políticos administrativos, competia a uma assembléia popular. Já a designação dos cabos de guerra, competia a Ganga-Zumba, ouvindo o conselho.
            A hierarquização governamental assumiu a forma de um sistema de parentesco simbólico. Os ministros eram “filhos” de Ganga-Zumba. Os comandantes militares, “irmãos”, os chefes de mocambos, “sobrinhos”, os funcionários e oficiais subalternos, “netos”, as mulheres velhas, “mães”.
            Ganga-Zumba assumiu uma grande autoridade, assim como privilégios, possuindo casa para sua família, guardas e oficiais que ficavam a sua disposição, era tratado por todos com o respeito de um rei.
            Mesmo numa sociedade onde o casamento era poliândrico em conseqüência da escassez de mulheres, Ganga-Zumba possuía três mulheres, uma mulata e duas crioulas, teve muitos filhos só com a primeira, isto tratava-se de um privilégio.
            Mesmo assim Ganga-Zumba não gozava de arbítrio. Não era absoluto, não podendo tomar decisões sem ouvir o conselho dos chefes dos mocambos que o elegera e o podia destituir.
            A derrocada de Ganga-Zumba começou quando firmou um acordo com os portugueses contendo os seguintes itens:

 1º liberdade para os nascidos em Palmares;
 2º Terras para viverem e cultivarem
3º Garantia de comércio e relações com os moradores vizinhos.
Em  Palmares diziam que era uma traição aceitar este acordo, pois diziam que os negros nascidos fora de Palmares voltariam à escravidão.
            Mas Ganga-Zumba aceitou o acordo. Houve luta dentro de Palmares. Uma pequena parte da população acompanhou Ganga-Zumba.
            Em novembro de 1678, Ganga-Zumba foi a Recife, confirmar pessoalmente o acordo. Foi recebido solenemente pelo governador. Pouco depois, partia para Cacaú, distante 32 quilômetros de Serinhaém, onde viveriam nas novas terras prometidas pelo acordo.
            Enquanto isso, o governador distribuiu 150 léguas de terras palmarinas a grandes proprietários pernambucanos. Como sempre, os livres pobres, que esperavam terras como recompensa, nada receberam.
            Mas nem os “premiados” conseguiram tomar posse de suas terras. Quando tentaram nelas entrar, foram violentamente repelidos pelos palmarinos.
            Somente uma pequena parte acompanhou Ganga-Zumba. A maioria ficou, agora sob o comando de Zumbi, que lutaria até a morte.


2.5. ZUMBI, O REI GUERREIRO.
            Foi com resistência armada, pouca na verdade, que Zumbi ocupou Macaco assumindo a confederação palmarina. Um conselho aclamou Zumbi e lhe outorgou poderes.
            As derrotas militares sofridas por Ganga-Zumba desencadearam um descontentamento profundo na massa palmarina e toda a culpa caiu sobre seus ombros, consta que tenha comandado uma operação militar em completa embriagues.
            Zumbi fazia forte oposição a Ganga-Zumba denunciando corrupção e principalmente sua incompetência militar, em todos os mocambos eram realizadas assembléias populares pedindo a deposição de Ganga-Zumba, menos Macaco.
            Zumbi já era reconhecido como chefe da oposição e passou a conspirar para depor Ganga-Zumba pela força. Ganga-Zumba sentia que não poderia detê-la, este foi mais um motivo para que Ganga-Zumba começasse a conversação de paz com o governo colonial.
            Mesmo com um pacto totalmente leonino[4], Ganga-Zumba seguiu em frente com o acordo que gerava grande desconfiança entre os palmarinos.
            Zumbi à frente das tropas marchou sobre os mocambos fiéis a Ganga-Zumba. Em alguns houve lutas, em outros a massa aderiu. Os maiorais e cabos de guerra fiéis a Ganga-Zumba fugiram para Macaco com suas famílias.
            Para Ganga-Zumba, Zumbi era opressor e queria o poder a todo custo para ser uma espécie de ditador, mesmo com bastante popularidade que ainda gozava em Macaco sentiu que não poderia resistir militarmente. Quando as tropas sob o comando de Zumbi já escalavam a Serra da Barriga, Ganga-Zumba retirou-se as pressas para Cacaú, acompanhado de 300 a 400 pessoas, prometendo aos que permaneceram em Macaco, voltar para os resgatar da opressão de Zumbi.
            Um conselho composto de adeptos aclamou Zumbi, rei. Sem perder tempo subordinou toda a vida de Palmares às exigências de guerra implacável que se anunciava. Os partidários de Ganga-Zumba foram expurgados de forma violenta. Deslocou mocambos inteiros para lugares estrategicamente mais seguros. Criou nova estratégia militar, multiplicou os postos de vigilância. Despachou agentes para reunirem armas e munições. Reforçou as fortalezas de Macaco tornando-as quase inexpugnável. Finalmente decretou a lei marcial, quem tentasse desertar para Cacaú, seria degolado.

2.5.1. Zumbi criado na cultura branca e católica romana
            Zumbi nasceu em Palmares em 1655. Ainda quando criança foi raptado e levado para Porto Calvo. Na época o então governador de Pernambuco, Francisco Barre, enviou a primeira expedição contra Palmares após a expulsão dos holandeses. Comandou-a Brás da Rocha Cardoso, um dos mais destacados comandantes da guerra. Entre os prisioneiros feitos numa pequena povoação palmarina estava Zumbi ainda recém-nascido. Foi entregue de presente ao padre português Antônio Melo, do distrito de Porto Calvo que o batizou com o nome de Francisco. Mais tarde, o padre afirma que Zumbi era um “engenho jamais imaginável na raça negra e que bem poucas vezes encontrei em brancos. Aos dez anos conhecia o latim que há de mister, e crescia o português e latim muito a contento” (4, 116). Diante das afirmações do padre, podemos pensar que as leis escritas em Palmares foram feitas por um negro.
            O padre além de ter ensinado latim e português a Francisco também o fez coroinha.
            Aos quinze anos, Zumbi fugiu para Palmares. Mas voltava às vezes a Porto Calvo, onde morava o padre, levando-lhe presentes em conseqüência da miséria que vivia, este gesto se repetiu várias vezes.
            Muito jovem ainda, Zumbi já era chefe de uma das povoações, isto aconteceu pelo seu espírito guerreiro, pela sua cultura e inteligência.
            Os portugueses diziam que ele era um “negro de singular valor, grande ânimo e constância rara” (4, 117). Quer dizer que apesar do racismo, os brancos admiravam Zumbi.
            Consta que Zumbi teve ao menos cinco filhos com uma mulher branca, chamada Maria, com que teria se casado e acompanhado Zumbi por ocasião de uma incursão realizada numa propriedade alagoana. Num combate contra a expedição de Manuel Lopes Galvão, recebeu um ferimento que o deixou coxo.


2.6. EM CACAÚ
            Ganga-Zumba comunicou às autoridades portuguesas suas suspeitas de que urdia uma conspiração para matá-lo.
            Os portugueses não cumpriram o acordo que fizeram com Ganga-Zumba. Havia uma tropa de índios e mamelucos ao redor dos negros em Cacaú e às vezes invadiam a área e capturavam os negros. Também não havia liberdade de comércio com a vizinhança e, além disso, as roças dos negros eram destruídas.
            Muitos negros voltaram para Palmares, outros passavam informações e armas aos palmarinos. Ganga-Zumba teme ser morto e fala para os portugueses sobre seus temores.
            Realmente havia uma conspiração, os negros planejavam voltar a Palmares, levando muitos escravos da região, armas e munições.  Foram descobertos e então precipitaram seus planos. Envenenaram Ganga-Zumba e mataram seus homens de confiança.
            Escapou Gana-Zona, irmã de Ganga-Zumba que organizou a resistência, junto com os portugueses. Houve luta interna. Os portugueses derrotaram os rebeldes, apoiando Gana-Zona. Os chefes da conspiração, João Mulato, Canhongo, Amaro e Gaspar foram degolados. Os outros foram divididos entre os grandes proprietários da região. Assim acabou-se a ilusão da possibilidade de acordo com os portugueses.


CAPÍTULO III
            A escravidão no Brasil foi abolida oficialmente no dia 13 de maio de 1888, por uma lei que levava a assinatura da Princesa Isabel. Mas três séculos antes disso, um grupo de escravos rebelados, construíram um país independente onde se tornaram homens livres, o mais famoso dos quilombos, o “Quilombo dos Palmares”, na Capitânia de Pernambuco.
            O “Quilombo dos Palmares” foi fundado na Serra da Barriga, região de Palmares, sua origem é anterior a 1600 (talvez 1597; a data não é precisa) e durou até 1694, portanto, quase um século.
            Os quilombos eram uma tentativa dos negros fugidos e rebelados, para se manterem livres, mas na maioria das vezes, eram logo derrotados e vendidos ou devolvidos a seus senhores. Porém este fato não aconteceu com o Quilombo dos Palmares, devido a um conjunto de fatores que analisaremos mais abaixo, ele resistiu por quase um século, como uma nação livre, agregando negros, índios e brancos pobres, estima-se que sua população chegou a 20.000 hab.
            Clóvis Moura afirma que no início Palmares, tinha apenas pequenos grupos que incursionavam pelas redondezas, porém com o tempo se fez necessário estruturar um exército e “para acudir à segurança de um número tão considerável de pessoas e de um território tão grande, necessitavam desenvolver um sistema defensivo eficaz que assegurasse a tranqüilidade dos seus habitantes.” (6, 45).
            O que nos cabe perguntar é: Qual o fator ou fatores que garantiram a longevidade do Quilombo dos Palmares? Cremos que foram um conjunto de fatores, que permitiram que o Quilombo dos Palmares, se prolongassem como uma nação livre por quase um século. Esses fatores são uma geografia privilegiada, as guerrilhas, técnicas de defesas e a própria resistência dos palmarinos.


3.1. GEOGRAFIA PRIVILEGIADA
            Como já vimos, o Quilombo dos Palmares estava localizada em uma região inóspita e de difícil acesso. A floresta continha uma confusão de ramos, que em muitas partes era impenetrável, impedindo até mesmo a entrada de luz. O clima da região de Palmares oscilava entre frios duros e estiagens destrutivas, a floresta tropical era falazmente dadivosa, porém sua mesma exuberância como que esmagava e oprimia a vida, pois continha insetos transmissores de doenças. A sucessão de serras e em especial a Serra da Barriga, dificultava a subida de canhões e de soldados com armas e armaduras pesadas.  Além do mais, a Serra da Barriga, permitia uma visão panorâmica da região o que facilitava a vigilância da capital Macaco.
            Podemos dizer que a geografia privilegiada do Quilombo dos Palmares, foi um dos fatores que permitiram sua longevidade.


3.2. GUERRILHAS NA SERRA
            As guerrilhas[5] organizadas pelos palmarinos foram um dos fatores mais importantes para a defesa do Quilombo dos Palmares, pois quando as expedições subiam para investir contra Palmares, eram surpreendidos na mata pelos palmarinos que atacavam e desapareciam prontamente sem que pudessem se defender, com isso havia uma grande baixa de soldados.
            A guerrilha era possível, porque os palmarinos conheciam como ninguém a floresta, sendo possível atacar de surpresa os soldados que investiam contra Palmares e sumirem mata adentro, sem deixar rastros.
            O filme Quilombo, dirigido por Cacá Diegues, com os atores Antônio Pompeo, Zezé Motta, Toni Tornado e Vera Fischer, relata uma guerrilha, começando desta maneira: Um homem chega a uma cidade e recruta homens para subirem e atacarem o Quilombo dos Palmares. Quando entram na mata encontram frutas e enquanto comem, os palmarinos atacam de surpresa. Escondidos em muitos lugares, como o topo das árvores e camuflados no solo. Os palmarinos atacam e matam todos os combatentes.


3.3. TÁTICAS DE DEFESA
            Os palmarinos desenvolveram táticas de defesa muito eficientes, que dificultava a subida de expedições a Palmares.
            Para se defenderem, criaram táticas de defesa como: paliçadas, fossos com lanças, além de um exército bem armado, com arcos e flechas, lanças e até armas de fogo, tomadas das expedições punitivas ou compradas dos elementos dos quais mantinham intercâmbio.

3.3.1. CONSTRUÇÕES DE FORTIFICAÇÕES
            Clovis Moura relata que os palmarinos iniciaram a construção de uma fortificação, confiadas, segundo algumas informações, a um mouro que se encontrava com eles. A revista Superinteressante nº 11 afirma que:

“As fortalezas européias tinham baluartes de forma triangular para que os soldados pudessem atirar para todos os lados. A paliçada da capital de Palmares era parecida. Na época, os portugueses atribuíram a sofisticação defensiva aos conselhos de um “mouro” que teria imigrado para Pernambuco e ajudado Zumbi.” (7, 40)
            As tropas de Domingos Jorge Velho ao chegarem a Macaco toparam com esta sólida paliçada tríplice, projetada para fustigar atacantes de várias direções. Os manuais de sítios aos fortes europeus recomendavam aos atacantes atacar linhas oblíquas de aproximação. Como cavar não era possível em terreno tão escarpado, a solução foi fazer uma cerca de pau a pique para proteger a ofensiva.


3.4. RESISTÊNCIA DOS PALMARINOS.
            Devemos levar em conta que além da geografia privilegiada, das guerrilhas e das táticas de defesa, precisamos perceber a resistência de um povo oprimido pela escravidão, como é o caso dos índios e dos negros e também a opressão econômica exercida sobre os brancos pobres, que se agregaram a Palmares.
            Os palmarinos resistiram como um povo forte, unidos no ideal de liberdade e igualdade. Em Palmares não havia preconceito de cor ou raça, pois o que os unia era o fato de que todos eram pobres, oprimidos e explorados. E criaram uma sociedade sem exploração e sem miséria. E também sem preconceito. Devemos lembrar que em Palmares todos eram iguais e que todas as coisas eram divididas igualmente entre todos.


3.5. A EXPEDIÇÃO DE DOMINGOS JORGE VELHO
            Foram várias as expedições contra o Quilombo dos Palmares. A primeira foi em 1602, esta primeira expedição anunciou a destruição de Palmares, porém logo chegaram notícias das atividades dos palmarinos na redondeza. Depois desta expedição, outras se levantaram contra Palmares, porém pelos vários motivos já citados, ele resistiu até 1694, quando um bandeirante paulista, chamado Domingos Jorge Velho, fora trazido de São Paulo para destruir Palmares.
            Segundo a Revista Superinteressante, número 11 de 1995, o exército do bandeirante era constituído de 800 índios e 200 mamelucos e brancos, e estava empregado matando índios e colonos do Piauí, quando fora convidado para investir contra Palmares. Demorou um ano em marcha, aproveitando para assaltar fazendas e roubar gado. 
            Domingos Jorge Velho é retratado segundo a inspiração heróica de bandeirante como um homem bem vestido, parecendo um nobre, porém ele parecia o que realmente era um caçador de índios pobre e rude. Quando chegou, o bispo de Pernambuco, D. Francisco de Lima ficou chocado e o descreve assim:
Esse homem é um dos maiores selvagens com quem tenho topado. Quando se avistou comigo trouxe consigo interprete, pois nem falar sabe. Não se diferencia do mais bárbaro tapuia. Lhe assistem sete índias concubinas e sua vida, até o presente, foi andar metido pelos matos à caça de índios e índias.” O governador de Pernambuco Caetano de Melo e Castro não deixou por menos e alertou o rei: “É gente bárbara, que vive do que rouba”. (7, 39)
            O ataque liderado por Domingos Jorge Velho a Palmares encontrou resistência ferrenha dos palmarinos, haja visto, que o primeiro ataque aconteceu no dia 23 de janeiro de 1694 e a queda de Macaco se deu somente no dia 06 de fevereiro de 1694.
            Após vários ataques sem sucesso, o bandeirante pede canhões ao governador Melo e Castro e eles chegaram no dia 03 de fevereiro de 1694. O ataque final ocorreu no dia 06 de fevereiro de 1694, Velho atacou Palmares com os canhões, destruindo a paliçada que protegia o quilombo. O resto foi massacre, foram aprisionados muitos negros. Nos meses seguintes, as outras povoações menos defendidas que Macaco, foram destruídas, uma a uma. Palmares sumiu do mapa.

CONCLUSÃO
            A escravidão é uma página vergonhosa da história brasileira e mundial, pois seres humanos, indígenas e negros, foram submetidos a maus tratos de toda a espécie. Feridos fisicamente, psicologicamente e principalmente em sua dignidade, como seres humanos. Apesar de serem tratados como animais, os escravos não desistiam de lutar por sua liberdade e quando tinham a chance, fugiam, formando comunidades livres chamadas quilombos. Nelas tinham oportunidade de construir um mundo livre, sem a opressão de seus senhores. Apesar de serem tratados como coisa pela sociedade da época, o negro não perdia sua interioridade humana. “E isso era suficiente para que, ao querer negar-se como escravo, criasse movimentos e atitudes de negação do sistema” (6, 8)
            Quando falamos em quilombo, nosso pensamento nos remete ao mais famoso dos quilombos, o Quilombo dos Palmares, chamado por historiadores como Décio Freitas, de “República dos Palmares”.
            Palmares foi uma tentativa dos negros escravos, para se verem livres da servidão que os oprimia e maltratava ferindo sua condição humana.
            Os palmarinos resistiram como um povo forte, unidos no ideal de liberdade e igualdade. Em Palmares não havia preconceito de cor ou raça, pois os que os unia era o fato de que todos eram pobres, oprimidos e explorados. E criaram uma sociedade sem exploração, miséria e preconceito. Devemos lembrar que em Palmares todos eram iguais e que todas as coisas eram divididas igualmente entre todos.
            A libertação dos negros ocorreu em 1888 por uma lei assinada pela então regente do império brasileiro, a Princesa Isabel, porém ela foi movida mais por interesses econômicos do que humanitários, pois era mais viável trazer um imigrante do que sustentar um escravo negro.
            Em nossos dias, o negro, o indígena e o pobre continuam sendo discriminados e escravizados pelo sistema econômico e social do Brasil. Eles continuam excluídos e marginalizados. Os negros, continuam ganhando menos, em muitas empresas não alcançam cargos de alto escalão, muitas não contratam negros para o trabalho, em novelas e filmes continuam fazendo os papéis de escravos e empregadas  domésticas. A situação do indígena e do pobre não é muito diferente.
            Apesar de serem discriminados, os negros continuam sua luta de resistência, através de movimentos que buscam o direito de serem cidadãos.
            Os excluídos e marginalizados de nossos dias não são somente o negro ou o indígena, mas também: os moradores de rua, os catadores de papelão, as prostitutas, os homossexuais, aidéticos, portadores de deficiências físicas e mentais, os sem-terra, as mulheres e os idosos entre outros. Todos lutam pelo direito de serem cidadãos e por sua dignidade.
            Terminaremos nossa conclusão com uma citação do livro os excluídos, da série Ensaios de Pós Graduação, da Universidade Metodista em São Bernardo do Campo (UMESP), que expressa a questão da luta pela inclusão social:
            Hoje os mais diversos movimentos sociais possuem em comum a luta pela cidadania. Trata-se, em primeiro lugar, do direito a ter direito. Os excluídos constituem-se sujeitos políticos numa lógica, que não é a mera inclusão no conjunto dos iguais, como se todos fossem iguais. Os excluídos, na luta pela cidadania, questionam a ordem: Se alguma coisa está fora de ordem, há de discutir essa ordem, ordem de quem e para quem? Os excluídos não pretendem tão simplesmente ser incluídos em toda e qualquer ordem. Eles buscam participar dos espaços onde se estabelecem as regras do jogo, onde sua maior contribuição é o direito a ser igual na diferença. Esta compreensão de cidadania tem recebido valiosa contribuição dos movimentos de luta pela moradia, dos portadores de deficiências físicas, dos movimentos de negros, mulheres, homossexuais e especialmente do movimento indígena. Os povos indígenas deste país não lutam apenas para demarcação dos seus territórios e preservação das suas culturas, mas também pela constituição do Brasil como um Estado pluriétnico. (5, 19)
         Esperamos que num futuro muito próximo todos os brasileiros possam comemorar o fato de ser um país livre de toda exclusão, da corrupção de toda espécie e ser um país realmente livre e feliz.


BIBLIOGRAFIA
1.    Anotações da Aula de Brasil Colônia
2.    Bíblia Sagrada, Edição Pastoral, Paulus, 1991.
3.    CONSELHO MUNDIAL DE IGREJAS CRISTÃS DO BRASIL (CONIC), Dignidade humana e Paz: Novo Milênio sem exclusões: texto base / CONIC, São Paulo, Editora Dom Bosco, 2000.
4.    FREITAS, D. Palmares, A Guerra dos Escravos, 5ª Ed., Porto Alegre, Mercado Aberto, 1984.
5.    GALAZZI, Alessandro e outros, Os Excluídos, Série Ensaios de Pós Graduação /      Ciências da Religião, São Bernardo do Campo, UMESP, 1996.
6.    MOURA, C., Os Quilombos e a Rebelião Negra, 2ª Ed., São Paulo, Brasiliense, 1981.
7.    ARNT, R. - BANALUME NETO, R., A Cara de Zumbi, in SUPERINTERESSANTE, Ano 09, nº 11, Editora Abril, 1995.
8.    ZWETSCH, R. (Organizador), 500 Anos de Invasão, 500 Anos de Resistência, São     Paulo, Ed. Paulinas/CEDI, 1992.  



[1]  Os capitães do mato eram profissionais na perseguição a escravos fugidos, que recebiam pagamento em troca da entrega dos negros a seus antigos senhores. Normalmente eram ex-escravos, mulatos, mamelucos, que trocavam seus serviços, por dinheiro.
[2] Segundo o dicionário eletrônico Aurélio, o termo em quimbundo quer dizer cumeeira que é a parte mais alta do telhado, cumeada, cavalete de telhado.
[3]  O Dicionário Aurélio eletrônico afirma que: dolicocéfalo, Diz-se do, ou o tipo humano cujo crânio é oval, sendo o diâmetro transversal menor, em um quarto, do que o longitudinal.
[4] Termo muito usado nos dias hoje para contratos quando há clausulas obscuras
[5]  O dicionário Eletrônico Aurélio explica guerrilha como uma Luta armada realizada por meio de pequenos grupos constituídos irregularmente, sem obediência às normas estabelecidas nas convenções internacionais, e que, com extrema mobilidade e grande capacidade de atacar de surpresa, visa ao crescimento progressivo das próprias forças mediante a incorporação de novos combatentes e abertura de novas frentes guerrilheiras até que se possam travar com êxito combates diretos contra as tropas regulares inimigas.

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